LICITAÇÃO E A PRESENÇA DE APENAS UM
LICITANTE
Sumário: 1 Introdução. 2 Ausência de imposição
legal de um número mínimo de licitantes nas normas gerais de licitação. 3 A
presença de apenas um licitante no certame e a responsabilização do agente
público. 4 Do pacífico entendimento doutrinário e dos egrégios Tribunais de
Contas. 5 Da presença de um licitante na licitação processada pela modalidade
convite. 6 Momento da verificação da presença de um licitante. 6.1 Sessão
pública de abertura da licitação. 6.2 Habilitação. 6.3 Julgamento das
propostas. 7 Aplicação do art. 48, §
3º, da Lei de Licitações na fase de habilitação e de julgamento das propostas
quando for verificado apenas um licitante. 8 A divergência de entendimento no
Superior Tribunal de Justiça. 9 A legalidade do avanço da licitação quando for
verificado apenas um proponente e o afastamento da revogação da licitação. 10
Considerações finais. 11 Referências bibliográficas.
1- Introdução
No
transcorrer de um procedimento licitatório, poderá a Administração promotora da
competição se deparar com apenas um interessado presente na sessão pública,
somente um licitante habilitado ou simplesmente um proponente classificado.
Diante
dessas ocorrências, tendo em vista que nas licitações públicas deve ser observado
o princípio da competitividade – circunstância que presume a necessidade de
efetiva competição entre os licitantes, o que exigiria, portanto, mais de um
particular –, a verificação das situações acima aduzidas pode gerar dúvida na Comissão de Licitação ou no Pregoeiro, no
sentido de considerar inválido o referido processo seletivo, fato que
eventualmente obstaria o prosseguimento da competição.
Como
abaixo se verificará, todavia, a presença de apenas um proponente nas etapas
licitatórias supramencionados é plenamente admissível, circunstância que de forma alguma não macula a legalidade
do processo administrativo licitatório, podendo a Administração promotora da
competição, portanto, prosseguir com o competição.
2- Ausência de imposição legal de um número mínimo de licitantes nas normas gerais
de licitação
Sabiamente,
o legislador ordinário não consignou na Lei federal nº 8.666/93 ou na Lei
federal nº 10.520/02[1],
como requisito de validade do certame licitatório, a presença de um número
mínimo de competidores, com exceção feita ao art. 22, § 3º[2],
da Lei de Licitações, que estabelece, na licitação processada pela modalidade convite,
que o ato convocatório (carta-convite) deve ser encaminhado para três
particulares, não obstante o entendimento do egrégio Tribunal de Contas da
União[3] em
exigir, além desse expediente, a presença de três propostas aptas, sem prejuízo da possibilidade de
prosseguimento desse processo seletivo com apenas um licitante, caso se
comprove limitações no mercado ou
manifesto desinteresse dos convidados, conforme determina o § 7º do artigo mencionado.
Registre-se, todavia, a existência da disciplina
constante do art. 49, inc. II[4]
da Lei Complementar nº 123/06 que afasta as benesses constantes do art. 47[5]
e 48[6]
da quando não houver um mínimo de 3 (três) fornecedores competitivos
enquadrados como microempresas ou empresas de pequeno porte sediados local ou
regionalmente e capazes de cumprir as exigências estabelecidas no instrumento
convocatório.
Conforme
se verificará a seguir, portanto, a inserção de um dispositivo dessa natureza
na legislação licitatória poderia dificultar, quando não inviabilizar, o
processamento das compras governamentais em nosso país.
3- A presença de apenas um licitante no certame e a responsabilização do agente
público
Antes de
adentrarmos no escopo do nosso trabalho, ressaltamos que somente será legal o
prosseguimento de uma licitação em que apenas um particular atende ao chamado
da Administração, tão-somente um licitante resta habilitado ou simplesmente um
proponente é classificado, quando a diminuição do número de competidores não
foi motivada por nenhum expediente editalício ilegítimo, cuja inserção no ato
convocatório foi proposital, com o fito de dirigir o certame para um
determinado particular. Observando-se tal circunstância, grife-se que é dever
da autoridade administrativa determinar a anulação da competição, na forma do
consignado no art. 49 da Lei de Licitações.
Ademais,
restringindo-se ilegalmente a participação de interessados na licitação de modo
que somente um particular atenda ao chamado da Administração promotora do
certame licitatório, ou restando apenas um licitante habilitado ou
classificado, em tese, impor-se-ão as devidas penalidades ao competente agente
público, dando-se cumprimento ao disposto no art. 82[7] da
Lei de Licitações; noutras palavras, poderá a restrição à competitividade, promovida
pelo agente público competente, caracterizar ato de improbidade administrativa
– prescrito no art. 10[8],
inc. VIII, da Lei de Improbidade Administrativa –, que o fará responder por ele
na esfera civil. No campo da responsabilização penal, a restrição da
competitividade da licitação submeterá o competente agente público ao tipo
penal aposto no art. 90[9] da
Lei de Licitações; além deste, o agente público ficará sujeito a sanção
disciplinar, estando a correspondente penalidade consignada no Estatuto dos
Servidores Públicos que o vincula à Administração Pública licitante.
Ademais,
não se pode deixar de ressaltar a possibilidade de essa restrição a caráter
competitivo da licitação também ser reprovada pelo órgão de controle externo,
podendo o competente Tribunal de Contas determinar a devida correção, em caso
de controle preventivo ou concomitante, bem como sanção
pecuniária, quando o controle for a posteriori.
4- Do pacífico entendimento doutrinário e dos Eg. Tribunais de Contas
A
possibilidade de prosseguimento de uma licitação quando se verifica apenas um
particular na sessão pública de abertura do certame, fase habilitatória ou
classificatória é sustentada há muito tempo, já merecendo destaque nos escritos
dos primeiros administrativistas brasileiros que versaram sobre licitações
públicas.
Oswaldo
Aranha Bandeira de Mello, nesse sentido, lecionou:
Salvo disposição legal ou regulamentar, ou do instrumento
de convocação dos interessados, em contrário, se só um candidato for julgado
habilitado, o procedimento há de prosseguir, bem como quando só ocorre ao
chamado um interessado, e, se havido habilitado, e apreciada a proposta,
considerada conforme, viável e precisa, será classificada e adjudicada, se nada
existir que a tanto se oponha. (1978, p. 96).
Regis
Fernandes de Oliveira, de longa data, também asseverou que:
Interessante problema surge quando apenas um candidato se
habilita ou se apenas um se apresenta à concorrência.
Como aponta Cintra do Amaral, “quem acudiu à licitação não
pode simplesmente ser ignorado. Se foi qualificado e teve sua proposta
considerada aceitável pela promotora da licitação deve ser ele o contratado”.
Realmente, tem razão o autor. Se comparece apenas um candidato à obra, serviço
ou compra pretendida, a Administração poderá contratar com o único interessado,
desde que a proposta satisfaça. E, mesmo nas hipóteses de inabilitação dos
demais interessados a Administração poderá contratar com o remanescente. (1981,
p. 60-61).
Celso
Antonio Bandeira de Mello também prelecionou a esse respeito:
VII – COMPARECIMENTO DE UM ÚNICO LICITANTE
129-A – 117. Se à licitação comparecer apenas um
interessado, deve-se apurar sua habilitação normalmente. Se habilitado, sua
proposta será examinada tal como ocorreria se outros disputantes houvesse. Não
há óbice algum a que lhe seja adjudicado o objeto da licitação, em sendo
regular sua proposta, pelo fato de inexistirem outros interessados. O mesmo
ocorrerá se vários comparecerem mas apenas um for habilitado. (1985, p. 60).[10]
O referido assunto também
foi abordado pela professora Lúcia Valle Figueiredo:
Vamos abordar, agora, o problema da apresentação de um
único candidato. Nessa hipótese prosseguir-se-á com a licitação e este único
candidato poderá vir a ser adjudicatário.
Em nossa opinião nada impede que a licitação prossiga, adjudicada,
a final, ao único proponente.
[...]
E, na hipótese que considerarmos, cabe a seguinte
distinção: ou se apresentou à habilitação tão-somente um único interessado ou,
depois de vários habilitados, com a desclassificação da proposta de alguns,
remanesceu apenas um. Neste caso, opinamos que o princípio é o mesmo: há de ser
defendido o direito do único a acudir ao chamado, ou do único que ofertou
viavelmente à Administração. (1994, p. 50-51).
A
respeito do mesmo tema, ensina Adilson de Abreu Dallari:
Acreditamos que o comparecimento de apenas um proponente
idôneo não invalida, por si mesmo, a licitação, pois a regra do tratamento
isonômico diz respeito ao chamamento de eventuais interessados e aos atos que
se praticarem com relação aos proponentes. O comparecimento de apenas um
interessado não afeta qualquer dos princípios originários ou originados da
licitação. Muito ao contrário, haveria ofensa ao princípio da isonomia se um
interessado idôneo, que tivesse atendido ao chamamento, fosse igualado a um
terceiro desinteressado, pois isto seria tratar igualmente pessoas
juridicamente desiguais. Em conclusão, entendemos que o único proponente idôneo
tem direito a ter sua proposta considerada (nada impede que essa proposta,
posteriormente, seja aceita ou seja considerada insatisfatória). (1997, p. 82).
Atualmente,
o referido entendimento também é sustentado pela doutrina especializada. Nesse
sentido, podemos citar Marçal Justen Filho, quando trata da presença de apenas
um licitante na licitação processada pela modalidade pregão:
A Lei nº 10.520 não condiciona a validade do pregão à
participação de um número mínimo de licitantes. Portanto, não seria cabível
aplicar ao caso a interpretação (combatida) de que somente na presença de três
propostas classificáveis seria válida a licitação na modalidade convite. Não há
qualquer identidade entre convite e pregão, o que inviabiliza aplicação extensiva
da referida interpretação. (2009, p. 170).
Da mesma forma é o
entendimento do saudoso mestre Diogenes Gasparini:
Não obstante essa orientação , a doutrina
e a jurisprudência dominantes
têm aceito como legal
o procedimento licitatório em que somente um interessado acode ao chamamento da Administração Pública
licitante se todas as exigências foram satisfatoriamente atendidas [...]. De
sorte que ,
mesmo sem
competição, a contratação em tais condições será válida. (2012, p. 544).
Por fim, manifesta-se Joel
de Menezes Niebuhr:
Em sentido oposto, se a Administração recebe proposta
válida, compatível com o edital, o autor dela é o vencedor da licitação e com
ele deve ser assinado o contrato. É ilícita a conduta da Administração que
refuta licitação em virtude de ter recebido só uma proposta ou de ter restado
válida uma só proposta. Isso não é o bastante para revogar a licitação, nem
para aplicar o inciso V do artigo 24 da Lei nº 8.666/93. (2003, p. 290).
Nesse
mesmo sentido é o entendimento dos órgãos de controle externo, como o Tribunal
de Contas da União – TCU, por exemplo:
A licitação procedida pelo TRT/PB para aquisição de veículo
não pode ser tida como viciada consoante entendeu esta Corte de Contas. As
especificações técnicas do veículo definidas no edital da competição por aquele
órgão, mesmo tendo restringido o universo de concorrentes, deu ensejo a que
mais de um competidor acorresse ao chamamento público. Se apenas uma empresa apresentou proposta, dentro do preço de mercado
aceito, isto não significa direcionamento do certame. (BRASIL, 2002, grifos
nossos).
Quanto ao comparecimento de somente uma empresa ao pregão
em tela, alinho-me à Unidade Técnica no sentido de que não há impedimento na
legislação à conclusão da licitação, a menos que o edital contenha exigências
restritivas ao caráter competitivo do certame, o que se verificou no caso.
(BRASIL, 2008).
88. Considerando-se
que a apresentação de somente um licitante configura indício, mas não
evidência, de que a competitividade da licitação teria restado em alguma
proporção prejudicada, realizou-se a ora combatida determinação. Note-se
que o Tribunal não entendeu serem tais irregularidades bastantes para a
anulação do contrato, nem que o comparecimento de apenas um licitante constitui
qualquer tipo de óbice à contratação. (BRASIL, 2010, destaques nossos).
Maria
Cecília Mendes Borges, Procuradora do Ministério Público junto ao Tribunal de
Contas do Estado de Minas Gerais, assim também asseverou, nos autos da Denúncia
nº 802.384, de relatoria do Conselheiro Sebastião Helvécio: “No caso em tela,
como as exigências foram consideradas legítimas, o comparecimento de apenas um
licitante não constitui por si só impedimento para a contratação.” (2010, p.
251).
Sobre o
tema já decidiu o egrégio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo:
Ação Civil Pública – Licitação – Alegação de nulidade, em
virtude de apenas uma licitante ter permanecido no certame – Ausência de
demonstração de prejuízo ao erário ou infringência aos princípios da legalidade
e da moralidade administrativa – Sentença de improcedência da ação –
Desprovimento do recurso. (BRASIL, 2011).
Por fim,
grife-se que o referido entendimento ultrapassa as nossas fronteiras
territoriais, merecendo destaque a lição professada por diversos juristas platinos,
cujas preciosas lições merecem reproduções.
Nesse
passo, ensina José Roberto Dromi, in
verbis:
En la licitación
pública no se requiere un número mínimo de licitadores. La existencia de sólo
una propuesta no invalida ni afecta en modo alguno la legitimidad del
procedimiento, salvo que el ordenamiento jurídico, por disposición expresa,
exija un número mínimo de proponentes. (2010, p. 377-378).
Com
propriedade, preleciona Miguel Marienhoff,
in verbis:
“Pero lo expuesto en
nada obta a que, si sólo se presentase "una" persona haciendo oferta,
si ésta fuere satisfactoria, se acepte la misma y se le adjudique el contrato a
dicha persona. Es éste un supuesto de " excepción" al"
principio" de oposición o concurrencia, que halla clara justificación en
el hecho de que todo aquel que lo hubiese deseado, podría haberse presenteado
como oferente. ( 1970, p. 201)
Enrique
Sayagues Laso, in verbis:
“94. Número mínimo de proponentes
Norma general es que El llamado a licitación ES válido sea
cual El número de proponentes que concurran al mismo. Públicamente se convoca a
todos os interesados a que concurran a La licitación; llegado el momento de La
recepción y apertura de las propuestas, El acto se lleva a caso con los que
hayan presentados ofertas, y La Administración La adjudica a La mas ventajosa
de todas.
No obstante, como El propósito que se persigue con toda
licitación, de conseguir La mejor oferta posible, se obtiene sólo parcialmente
cuando han habido pocos licitantes, muy a menudo se limita aquel principio,
estabeleciendo um mínimo de concurrentes para que La licitatión sea válida.
Pero no existiendo disposición expresa
en ese sentido, El acto tiene lugar cualquiera
sea El número de postores.”(1978. p. 100)
Por fim, leciona Bartolome Fiorini, in verbis: “Basta que La administración prepare todas
las condiciones necessarias para permitir la concurrencia; La circunstancia de
que se presente uma sola oferta no afecta la validez del procedimiento ni
impide la adjucación . En neste caso se supone una tácita y voluntaria
exclusión frente al llamado para presentar ofertas. Se entiende que quienes no
concurren ante la invitación tienen la intención de abstenerse de competir.”(1972. p 44)
5- Da presença de um apenas licitante na licitação processada pela modalidade convite
Estabelece
o art. 22, § 3º, da Lei de Licitações que o convite é a modalidade de licitação
entre interessados do ramo pertinente ao seu objeto, cadastrados ou não, escolhidos e convidados em número mínimo de três
pela unidade administrativa, a qual afixará, em local apropriado, cópia do
instrumento convocatório e o estenderá aos demais cadastrados na correspondente
especialidade que manifestarem seu interesse, com antecedência de até 24 horas
da apresentação das propostas.
Adite-se,
ainda, que estabelece o § 7º do art. 22 que, quando – por limitações do mercado
ou manifesto desinteresse dos convidados – for impossível a obtenção do número
mínimo de licitantes exigidos no § 3º desse artigo, essas circunstâncias
deverão ser devidamente justificadas no processo, sob pena de repetição do
convite.
Dessa
forma, conjugando-se os dispositivos acima aduzidos, se a Administração
licitante convidou o número mínimo de três interessados do ramo pertinente,
cadastrados ou não, e estendeu o convite aos demais cadastrados que se
interessassem em participar do certame, mas, mesmo assim, não obteve êxito no
número mínimo de interessados ou de propostas, seja por limitações de mercado
ou manifesto desinteresse dos convidados, estará a repartição promotora da
licitação autorizada, uma vez justificada tal ocorrência nos autos do processo
licitatório, a dar prosseguimento ao certame.
Sobre o
tema ensina o saudoso jurista Diogenes Gasparini:
Grife-se,
todavia, que o referido posicionamento é polêmico, uma vez que se tem entendido
que, além de a Administração licitante proceder ao convite de três
particulares, deverá verificar no certame três propostas aptas para que o
prosseguimento da licitação seja lícito.
Nesse
sentido é a Súmula nº 248 do egrégio Tribunal de Contas da União:
Não se obtendo o número legal mínimo de três propostas
aptas à seleção, na licitação sob a modalidade Convite, impõe-se a repetição do
ato, com a convocação de outros possíveis interessados, ressalvadas as
hipóteses previstas no parágrafo 7º, do artigo 22, da Lei 8.666/93.
Acerca
dos objetivos dessa súmula, justifica-se o egrégio TCU:
Essa interpretação dada ao dispositivo está em consonância
com o próprio objetivo da licitação, que é o de encontrar a proposta mais
vantajosa para a administração, o que, via de regra, se consegue quanto maior o
nível de competitividade envolvido. Assim, por exemplo, num caso em que três
empresas são convidadas, mas apenas uma apresenta proposta válida, não se tem
de fato uma competição. Em razão disso, entende o Tribunal que são necessárias
três propostas válidas para que a contratação possa ser realizada. Até para
evitar situações, já detectadas diversas vezes pelo Tribunal, em que são realizadas
licitações “de fachada”, nas quais são convidadas três empresas, sabendo-se de
antemão que apenas uma tem condições de fornecer o produto ou executar o
serviço. Ou mesmo situações em que não está presente a má-fé, mas o nível de
competição verificado no certame é baixo, e existem outras empresas, não
convidadas, aptas a participar da licitação.
É claro que há situações especiais, em que o mercado é
pouco competitivo ou que os possíveis fornecedores demonstram desinteresse em
participar da licitação. Nesse tipo de situação, que constitui uma exceção à
regra geral e precisa ser demonstrada no processo administrativo de licitação,
não se precisará repetir o convite. É o que dispõe o art. 22, § 7º da Lei nº
8.666/93.
Criticando
o referido mandamento da egrégia Corte de Contas da União, assevera o jurista Marçal Justen Filho:
A inexistência de, no mínimo, três potenciais
interessados ou não-comparecimento de licitantes em tal número não se constitui
em causa de invalidação do procedimento licitatório não obstante a insistência
dos Tribunais de Contas em adotar a interpretação distinta. Mas a Administração
deverá justificar, por escrito, a ocorrência.
Não é compatível
com a Lei
o argumento de que
o número mínimo
de três deverá ser
apurado em relação
às propostas válidas. Alguns têm afirmado que ,
inexistindo número igual
ou superior
a três propostas
válidas, a licitação deverá ser repetida. Ou
seja, o problema não
seria de dirigir o convite
para três licitantes , mas
de ser por ela
atendido (2012, p. 298).
Desta feita, não obstante o entendimento do TCU, o fato de
apenas um licitante comparecer ao
certame processado por convite, ou eventualmente
somente uma das empresas
participantes lograr êxito na fase habilitatória (se existente) ou
de classificação e julgamento das propostas (número
de propostas válidas inferior a três ),
por si
só , não
implicará a necessidade de sua renovação, estando, pois ,
a Administração promotora do certame licitatório legitimada a dar
continuidade aos expedientes
licitatórios, desde que
justificada a ocorrência.
6- Momento da verificação da presença de um licitante
6.1
Sessão pública de abertura da licitação
Mesmo a
Administração promotora da licitação observando estritamente os ditames fixados
no Estatuto Federal Licitatório, garantindo, por exemplo, a efetiva publicidade
da competição e a lisura do ato convocatório, no sentido de este ser totalmente
desprovido de qualquer expediente que possa restringir a competitividade do
processo seletivo; grife-se que, na ocasião da abertura da sessão pública do
torneio licitatório, poderá ser observada a presença de apenas um interessado
no local de abertura dos envelopes.
Ressalte-se
que a referida situação pode ter infindáveis motivos; apontam-se dois, já
previstos na própria Lei de Licitações, no § 7º[11]
do art. 22, que permite que a licitação processada por convite prossiga com
menos de três interessados, quais sejam, a limitação
de mercado e o desinteresse de
particulares.
Com
efeito, é de se destacar que foi dada igual oportunidade para todos os
potenciais interessados comparecerem à repartição promotora do certame
licitatório, na data fixada no ato convocatório, munidos dos devidos envelopes.
Desse modo, não poderá a Administração revogar a licitação, sob pena de violar
o princípio da isonomia, já que o único licitante não pode ser punido pelo
desinteresse de outros particulares.
De fato,
agir assim atenta de forma discriminatória a esse único interessado, pois a
ausência de competidores não autoriza a Administração a desqualificar a sua proposta,
ignorando-a, a ponto de se pretender pôr fim à licitação.
Nesse
sentido, ensina José Roberto Dromi:
La comparecencia de apenas un proponente no invalida los
princípios del procedimentos licitatorios. La regla de tratamiento igualitario
es respetada con el llamamiento a eventuales interesados Por el contrario,
habría una lesión al principio de igualdad, si un interesado idóneo, que
cumplimentó los presupuestos del llamado, fuese igualado a terceros
desinteresados. Repetimos que el proponente tiene siempre derecho a que su
oferta sea considerada aunque sea la única que se presente. (2010, p. 377-378).
Ocorrendo
a referida situação, o mesmo procedimento a ser empreendido pela Administração ao
se verificarem na licitação diversos interessados deverá ser implementado no
momento da ocorrência de apenas um interessado nas etapas já apontadas.
Assim, considerando-se a inexistência de ilegalidade
no edital, entende-se que aquele único interessado, que compareceu à sessão
pública na data aprazada, atendendo ao chamado da Administração licitante, tem
o direito de permanecer na competição, não podendo, por esse motivo, ser o
referido processo seletivo encerrado precocemente.
Sugere-se,
por fim, em reverência ao princípio da competitividade, a fim de eventualmente
afastar a referida situação nessa fase do procedimento licitatório, que o ato
convocatório autorize, quando apenas um licitante acudir ao chamado da
Administração, o Pregoeiro ou a Comissão de Licitação a prorrogar a abertura da
sessão pública do certame em 15 minutos (por exemplo), concedendo, assim, nova
oportunidade a algum proponente atrasado.
6.2
Habilitação
Poderá
acudir ao chamado da Administração licitante para apresentar os devidos
envelopes uma multiplicidade de interessados, sendo, esse, aliás, o expediente
que comumente ocorre nas licitações processadas pela Administração Pública
brasileira; entretanto, nem todos eles, após o julgamento e apreciação dos
recursos, serão considerados aptos para prosseguir na competição. Nessa
oportunidade, poderá apenas um particular atender à documentação habilitatória
exigida no edital.
Assim,
considerando-se a inexistência de expediente redutor da competição, bem como a
necessidade de observância do princípio da isonomia (já que todos os
interessados tiveram a oportunidade de apresentar a documentação de acordo com
o edital), deve a Administração considerar habilitada somente aquele licitante
que atendeu às condições do edital, avançando, assim, no processamento da
licitação.
Nesse
caso, não há como arguir a ausência de competição no processo seletivo já que
diversos competidores apresentaram-se para participar do torneio e, por motivo
imputado tão-somente ao licitante, houve o seu legítimo alijamento da
competição.
Assim,
sem mais delongas, ressalte-se que deve prosseguir a licitação em que apenas um
licitante foi declarado habilitado, realizando-se os atos subsequentes relativos
à modalidade que processa a licitação, salvo se verificado que a ausência de
competidores foi causada por alguma condição editalícia ilegal, circunstância que
demandará a anulação do processo seletivo, como já foi acima ressaltado.
6.3
Julgamento das propostas
No
decorrer do processo licitatório, poderá observar-se que apenas uma proposta está
em conformidade com os requisitos editalícios, não sendo considerada inexequível
ou superestimada, independentemente do fato de terem-se apresentado na sessão
pública de abertura da licitação um ou diversos licitantes.
Nessa
situação, considerando-se a inexistência de disciplina editalícia no sentido de
direcionar o objeto da licitação para esse único proponente – circunstância que
demanda a anulação do certame por flagrante violação ao princípio da
competitividade –, atendendo a sua proposta às exigências do edital, em
detrimento dos demais, e em sendo, ainda, exequível a oferta; deverá a
Administração promotora da licitação classificá-la.
Desta
forma, deverá ocorrer, porque a presença de apenas um licitante não conduz ao
entendimento de que a Administração promotora do certame licitatório irá
realizar uma contratação desvantajosa, pois, existindo um ou diversos
licitantes na competição, somente será adjudicado o objeto da licitação ao
particular detentor de uma proposta que se encontre dentro dos parâmetros
constantes da pesquisa de mercado.
Nesse sentido,
destaque-se que foi dada igual
oportunidade para todos os interessados comparecerem à sessão pública,
atenderem às exigências habilitatórias e apresentarem uma proposta competitiva;
logo, a não adjudicação do objeto da licitação a esse único proponente – que
teve a sua proposta classificada – para promover a revogação do certame
caracterizará violação ao princípio da isonomia, já que esse particular, que se
empenhou para estar na referida fase do processo licitatório, não poderá ser
prejudicado em virtude da incompetência dos demais que, por tal e qual motivo,
não se apresentaram na sessão pública ou, no caso daqueles que acudiram ao
chamado da Administração, foram inabilitados ou desclassificados.
Com
efeito, ressalte-se que inexiste fundamento legal para a Administração
licitante, motivada pela verificação de apenas uma proposta classificada, pôr fim
à licitação. Como já foi asseverado, tal situação não desqualifica a oferta do particular. O que torna ilegítima a sua
proposta é ela se apresentar como inexequível, superestimada ou por desatender a
alguma exigência editalícia – circunstância que demandará a sua
desclassificação.
Adilson
de Abreu Dallari, quando preleciona acerca do julgamento das propostas, ensina
que:
A qualidade da proposta independe do número de proponentes.
Havendo apenas uma proposta que satisfaça plenamente ao pretendido pode ser
altamente danoso para a Administração, pois além do tempo perdido e das
despesas acarretadas pela renovação do procedimento, nada impede que aquele
mesmo licitante único altere o preço proposto anteriormente, em prejuízo da
Administração, seja por prevalecer-se da situação de único interessado, seja
simplesmente em decorrência da inflação.
Acima de tudo, não há por que invalidar-se a licitação
exclusivamente pelo fato da existência de uma só proposta valida, se a
Administração pode não aceitar tal proposta, caso, afinal, ela se revele
comprovadamente insatisfatória ou inconveniente. Havendo apenas uma proposta
viável pode-se, imediatamente, passar à fase seguinte. (1997, pp. 135-136).
No caso
de uma licitação processada pela modalidade pregão, dada a impossibilidade da
realização da fase de lances com apenas um licitante, deverá o pregoeiro
negociar com esse único particular, conforme determina o art. 4º, inc. XVII, da
Lei do Pregão, com o fito de buscar condições ainda mais vantajosas para a
Administração licitante[12].
Nesse
caso, o prosseguimento dessa licitação também não restará obstada em face de
uma negociação infrutífera, desde que a oferta desse único licitante se
encontre dentro dos parâmetros mercadológicos.
7- Aplicação do art. 48, § 3º, da Lei de Licitações na fase de habilitação e de
julgamento das propostas quando for verificado apenas um licitante
Como acima
restou assentado, poderá prosseguir uma licitação que acudiu apenas um
interessado, realizando-se a próxima fase no procedimento licitatório, que será
a habilitação nos casos de convite, tomada de preços ou concorrência, sem
prejuízo da legislação que determinou a inversão das fases da competição, ou o
julgamento das propostas, no caso específico de licitação processada pela
modalidade pregão.
Nesse sentido,
cotejando a documentação constante do envelope habilitatório com os requisitos
fixados no ato convocatório, poderá ser observado que o único proponente que
compareceu ao certame não foi considerado apto para permanecer no torneio, por
não atender às exigências editalícias. Nesse caso, não restará alternativa para
a Administração promotora do certame a não ser a inabilitação do único
licitante, sob pena de violação ao princípio da estrita vinculação ao edital.
Também poderá
ser verificado que a proposta desse único licitante não atendeu aos reclamos
editalícios já que, por exemplo, as características do objeto que constou da sua
proposta são distintas daquelas consignadas no edital ou, ainda, a oferta desse
particular foi considerada inexequível ou superestimada, quando cotejada com o
valor estimado da contratação.
Assim, nesse
último caso, não sendo a exequibilidade da proposta comprovada ou tendo sido
superestimados os preços apresentados, na forma do art. 48, inc. II, da Lei de
Licitações, não restará alternativa para a Administração licitante senão
desclassificar a única proposta.
Nessas ocasiões,
independentemente da modalidade que processou a licitação, poderá a
Administração promotora do certame licitatório, após o julgamento do competente
recurso que manteve a inabilitação ou a desclassificação, se houver, com
fundamento no art. 48, § 3º, da Lei de Licitações, conceder o competente prazo
para que o único licitante apresente nova documentação ou proposta escoimada
dos vícios observados.
Com efeito, da
mesma forma com que se franqueia a possibilidade de apresentação de nova
proposta ou documentação escoimada dos vícios nas licitações em que há uma
multiplicidade de competidores, deve ser garantida a intenção do legislador nos
certames em que a competição é reduzida, sob pena de violação ao princípio da
isonomia.
Desta feita,
repise-se que a mesma oportunidade concedida para se apresentar nova proposta
ou documentação escoimada de vícios, quando no torneio licitatório se observam
diversos licitantes, não pode ser negada acaso haja apenas um proponente.
Corroborando
nossa assertiva tem-se a manifestação do egrégio Tribunal de Contas da União:
29. A aplicação do § 3º do art. 48 pressupõe a
desclassificação de todas as propostas ou a inabilitação de todos os
licitantes. O princípio da isonomia impede que a Administração faculte a
renovação dos documentos ou das propostas quando houver licitantes habilitados
ou classificados. Portanto, se um único licitante preencher os requisitos
estabelecidos no edital, não se deve admitir o saneamento dos vícios por parte
dos demais.
30. Além disso, a regra não pode ser aplicada
relativamente a licitantes já excluídos em outras fases no curso da licitação.
Desclassificada a proposta técnica da única participante do certame, não cabe
facultar aos licitantes eliminados na fase de habilitação apresentar novos
documentos ou novas propostas técnicas. Os licitantes inabilitados já foram
excluídos da licitação e não devem ser reconvocados pela desclassificação da
proposta técnica do proponente remanescente.
31. Outrossim, a
existência de apenas um concorrente em determinada fase do certame, a meu ver,
não desnatura a aplicação do § 3º do art. 48 da Lei nº 8.666/1993. (Acórdão nº 2048/2006 –
Plenário – Trecho do voto do Ministro Relator Benjamin Zymler, grifos nossos).
8- A divergência de entendimento no Superior Tribunal de Justiça
Não
obstante seja esse o entendimento pacífico da melhor doutrina e das egrégias
Cortes de Contas, como acima restou exaustivamente demonstrado, no Superior
Tribunal de Justiça vislumbra-se que o mesmo é controverso, dada a verificação
de decisões que se manifestam pela possibilidade da revogação da licitação
quando for verificada a presença de apenas um licitante na competição e de
acórdão cujo teor é no sentido de ser possível o prosseguimento do certame
quando da existência de apenas um competidor.
Nesse
sentido, posicionando-se pela impossibilidade da condução da licitação com
apenas um proponente, têm-se os seguintes acórdãos:
Administrativo. Licitação. Apenas um candidato em condições de participar. Revogação pela
Administração: possibilidade, pois o interesse público recomenda que mais de um
candidato participe efetivamente da licitação. Recurso não conhecido. (REsp.
nº 46.179–MG, 2ª T., rel. Ministro Adhemar Maciel, DJ de 11/5/1998, destaques nossos).
Administrativo – Licitação – Modalidade Pregão Eletrônico –
Revogação – Contraditório.
1. Licitação obstada pela revogação por razões de interesse
público.
2. Avaliação, pelo Judiciário, dos motivos de conveniência
e oportunidade do administrador, dentro de um procedimento essencialmente
vinculado.
3. Falta de competitividade que se vislumbra pela só
participação de duas empresas, com ofertas em valor bem aproximado ao limite
máximo estabelecido.
4. A revogação da licitação, quando antecedente da
homologação e adjudicação, é perfeitamente pertinente e não enseja contraditório.
5. Só há contraditório antecedendo a revogação quando há
direito adquirido das empresas concorrentes, o que só ocorre após a homologação
e adjudicação do serviço licitado.
6. O mero titular de uma expectativa de direito não goza da
garantia do contraditório.
7. Recurso ordinário não provido. (RMS nº 23.402–PR, 2ª T.,
rel. Ministra Eliana Calmon, DJe de 2/4/2008).
[...] 8. A
participação de um único licitante no procedimento licitatório configura falta
de competitividade, o que autoriza a revogação do certame. Isso porque uma das
finalidades da licitação é a obtenção da melhor proposta, com mais vantagens e
prestações menos onerosas para a Administração, em uma relação de
custo–benefício, de modo que deve ser garantida, para tanto, a participação do
maior número de competidores possíveis. (RMS nº 23.360–PR – Relatora: Min.
Denise Arruda, julgamento: 18/11/2008, DJe
17/12/2008, destaques nossos).
Pela
possibilidade de prosseguimento da licitação, temos o seguinte entendimento:
Administrativo. RMS. Recurso do artigo 109 da Lei 8.666/93.
Amplitude.
1. A autoridade superior quando do julgamento do recurso
inserto no artigo 109 da Lei de nº 8.666/93 pode adentrar no mérito da decisão
que habilitou e inabilitou licitantes.
2. Inviável a via do mandamus para discutir deficiência de
comprovação de capacidade técnica aferida em licitação sem prova inequívoca do
cumprimento das exigências do edital.
3. Não há óbice legal a
continuação de certame licitatório quando reste habilitado apenas um dos
licitantes, desde que cumprido o rito procedimental da licitação.
4. Recurso ordinário em mandado de segurança improvido.
(RMS n º 19.662 – SP (2005/0034194-2 – Relator : Ministro Castro Meira,
julgamento 16/3/2006, DJ 27/03/2006
p. 243, destaques nossos).
9 - A legalidade do avanço da licitação quando for verificado apenas um proponente e
o afastamento da revogação da competição
Como
restou assentado, não havendo vício no ato convocatório, no nosso entender, inexistirá
fundamento legal para que a Administração promotora do certame revogue a
licitação quando for observado apenas um licitante nas fases do processo
seletivo já mencionadas acima.
Caso
verifique-se que a ausência de competidores ou o alijamento de proponentes do certame
(por inabilitação ou desclassificação) foi causado por uma exigência
injustificada não amparada na Lei de Licitações, entende-se que a providência
da Administração será a de anulação da licitação, como já restou assentado
acima.
Para que
a revogação de uma licitação seja lícita, em qualquer fase do procedimento
licitatório, deverá existir o preenchimento das condições dispostas no caput do art. 49 da Lei de Licitações[13],
quais sejam, existência de razões de
interesse público, decorrente de fato
superveniente devidamente comprovado, pertinente
e suficiente para justificar tal conduta,
a ser consignado em parecer devidamente motivado.
Acerca
desses requisitos, exigidos pela lei para que a revogação seja lícita, ressalte-se
que a presença de apenas um licitante na sessão pública de habilitação, nas
fases habilitatória ou classificatória, seria um fato superveniente.
Em
relação, todavia, à exposição dos reais motivos invalidatórios, isto é, a
“justa causa”, que seja suficiente para justificar a revogação da licitação,
tem-se que tal requisito apresenta dificuldade de comprovação; como ensina Hely
Lopes Meirelles:
Não havendo justa
causa, quer para a revogação, quer para a anulação, a decisão revocatória
ou anulatória torna-se arbitrária, porque uma e outra estão vinculadas aos
motivos que as autorizaram, ou seja: o interesse público, para a revogação; a ilegalidade, para a anulação. (2007, p. 179).
Nesse passo,
caso a Administração promotora do certame não
consiga demonstrar essa “justa causa”, qual seja, o prejuízo ao interesse
público que repousa na presença de apenas um licitante, a revogação do certame
será irregular e possibilitará que esse único interessado, caso se sinta
prejudicado, discuta a referida situação no Poder Judiciário, circunstância que
adiará ainda mais o atendimento da necessidade administrativa almejado com o
objeto da licitação revogada.
A nosso ver,
a presença de apenas um licitante nas fases já apontadas não seria justa causa
para a Administração pôr fim ao processo licitatório já que, dependendo da fase
da licitação, não se sabe se esta avançará para as fases subsequentes.
Assim,
entende-se que deve a Administração promotora da licitação prosseguir com o
certame, verificando as condições habilitatórias desse único particular ou
aferir a sua proposta comercial, antes de tomar qualquer decisão a respeito.
Acrescente-se,
ainda, que não se verifica na manutenção da licitação com apenas um particular
a violação a nenhum dispositivo legal da Lei de Licitações ou a princípio
licitatório ou de direito público, salvo exceções acima estampadas.
Nesse sentido,
ao cabo do procedimento, observando-se ofertas vantajosas, indaga-se: será que
a presença de apenas um particular nas fases acima delineadas desaconselharia o
prosseguimento da licitação, como manifestou o Superior Tribunal de Justiça nas
decisões expostas acima, ou somente sinalizaria[14] a
referida oportunidade, o que demandaria a necessidade de a Administração
licitante analisá-la, de forma cautelosa, a fim de prejudicar o direito do
único particular de contratar com a Administração licitante.
No nosso sentir,
tem-se que a verificação da presença de apenas um particular na competição em
plenas condições habilitatórias e comerciais (preços vantajosos) de
prosseguir no processo seletivo, não autoriza a revogação da licitação, sob
pena de ser violado o princípio da isonomia, cujo entendimento acima já foi
delineado, circunstância que permite ao licitante prejudicado
questionar tal postura em vias administrativas ou judiciais.
Ademais, ressalte-se
que revogar a licitação por causa da presença de apenas um licitante, nas fases
apontadas, além de postergar a contratação, poderá causar prejuízo ao interesse
público almejado com o referido objeto e à Administração promotora do certame,
que deverá movimentar novamente a máquina administrativa desnecessariamente,
para processar novo certame que não terá certeza que acudirá mais interessados
ou que receberá uma proposta mais vantajosa do que aquela que irá dispensar em
face da suposta ausência de competitividade.
Sobre o
tema ensina o jurista argentino José Roberto Dromi:
La inadmisibilidad del ofertante único, por serlo, importa
adherir a un criterio sumamente formalista y dañoso para la economía y
celeridad del obrar administrativo, pues además del tiempo perdido y el costo
que acarrea la renovación del procedimiento, nada impede que se presente el
mismo y único oferente. (2010, p. 378).
Por fim,
no nosso sentir, verifica-se que terá a Administração promotora do certame mais
razões para justificar a manutenção da licitação com apenas uma particular do que
revogar o processo licitatório motivado pela suposta falta de competitividade.
10- Considerações finais
Como
restou assentado, é legítimo que o processo licitatório prossiga quando somente
um particular atendeu ao chamado da Administração promotora do certame
licitatório, só um licitante apresentou a documentação exigida no ato
convocatório – restando, portanto, habilitado –, ou simplesmente um proponente
apenas teve a sua proposta classificada.
Nesse
sentido, o referido entendimento é comungado por toda a doutrina
administrativista, bem como pelos órgãos de controle externo, sem prejuízo das
divergências observadas no Superior Tribunal de Justiça.
Para que
o processo licitatório avance, todavia, deverá o ato convocatório ser
desprovido de qualquer tipo de expediente que possa, de alguma forma,
restringir a participação de interessados, sob pena de o agente público
competente ser responsabilizado, na forma da lei, civil, penal e
administrativamente.
Assim,
esse único interessado tem o direito de permanecer no certame, não podendo o
referido processo seletivo ser encerrado precocemente por esse motivo, devendo
a Administração licitante praticar os atos subsequentes caso esse particular
atenda a todos os requisitos do edital e apresente um preço vantajoso, tendo,
com isso, adjudicado para si o objeto da licitação e sagrado-se vencedor do
torneio.
11- Referências bibliográficas
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1. A
constatação de ocorrência de fraude à licitação, com configuração de dano ao
Erário, enseja a condenação dos responsáveis em débito, julgamento pela
irregularidade das contas e aplicação de multa.
Acórdão
1209/2009 - Plenário
Sayagues Laso, Enrique La licitacion publica / Enrique
Sayagues Laso. 1978 Bib. Nadir Gouvea Kfouri( 2/ 0)
Fiorini, Bartolome A Licitacion publica : seleccion
del contratista estatal / Bartolome A. Fiorini. 1972 Bib. Nadir Gouvea Kfouri( 1/ 0)
A
[1] Jessé
Torres Pereira Junior, ao tratar de licitação instaurada na modalidade
“pregão”, também adota o mesmo raciocínio, conforme se infere: “25) O pregoeiro poderá aceitar a
participação de licitantes em número inferior a três ? R. - Sim. Não se
encontra nas normas da MP ou do decreto qualquer vedação a esse respeito. Seria
ilegal que o pregoeiro se recusasse a instaurar o pregão porque não houvesse o
comparecimento de pelo menos três licitantes”. (2009, p. 1.079, destaques do
autor).
[2] “§ 3º Convite é a modalidade de
licitação entre interessados do ramo pertinente ao seu objeto, cadastrados ou
não, escolhidos e convidados em número mínimo de 3 (três) pela unidade
administrativa, a qual afixará, em local apropriado, cópia do instrumento
convocatório e o estenderá aos demais cadastrados na correspondente
especialidade que manifestarem seu interesse com antecedência de até 24 (vinte
e quatro) horas da apresentação das propostas.”
[3] “Acórdão nº 2048/2006 – Plenário –
Trecho do voto do Ministro Relator Benjamin Zymler – ‘Ressalvados os casos de
licitação na modalidade convite, onde se exige o número mínimo de três
propostas aptas à seleção, a Lei nº 8.666/1993 não condiciona a validade de
seus certames à participação de um número mínimo de licitantes.’”
[4] Art. 49. Não se aplica o
disposto nos arts. 47 e 48 desta Lei Complementar quando:(...) II - não houver
um mínimo de 3 (três) fornecedores competitivos enquadrados como microempresas
ou empresas de pequeno porte sediados local ou regionalmente e capazes de
cumprir as exigências estabelecidas no instrumento convocatório;
[5] Art. 47. Nas
contratações públicas da União, dos Estados e dos Municípios, poderá ser
concedido tratamento diferenciado e simplificado para as microempresas e
empresas de pequeno porte objetivando a promoção do desenvolvimento econômico e
social no âmbito municipal e regional, a ampliação da eficiência das políticas
públicas e o incentivo à inovação tecnológica, desde que previsto e
regulamentado na legislação do respectivo ente.
[6] Art. 48. Para o cumprimento do disposto
no art. 47 desta Lei Complementar, a administração pública poderá realizar
processo licitatório:
I - destinado exclusivamente à
participação de microempresas e empresas de pequeno porte nas contratações cujo
valor seja de até R$ 80.000,00 (oitenta mil reais);
II - em que seja exigida dos licitantes
a subcontratação de microempresa ou de empresa de pequeno porte, desde que o
percentual máximo do objeto a ser subcontratado não exceda a 30% (trinta por
cento) do total licitado;
III - em que se estabeleça cota de até
25% (vinte e cinco por cento) do objeto para a contratação de microempresas e
empresas de pequeno porte, em certames para a aquisição de bens e serviços de
natureza divisível.
[7] “Art. 82. Os agentes administrativos
que praticarem atos em desacordo com os preceitos desta Lei ou visando a
frustrar os objetivos da licitação sujeitam-se às sanções previstas nesta Lei e
nos regulamentos próprios, sem prejuízo das responsabilidades civil e criminal
que seu ato ensejar.”
[8] “Art. 10. Constitui ato de improbidade
administrativa que causa lesão ao erário qualquer ação ou omissão, dolosa ou
culposa, que enseje perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou
dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas no art. 1º desta lei, e
notadamente:
[...]
VIII – frustrar a licitude de processo licitatório ou
dispensá-lo indevidamente.”
[9] “Art. 90. Frustrar ou fraudar, mediante
ajuste, combinação ou qualquer outro expediente, o caráter competitivo do
procedimento licitatório, com o intuito de obter, para si ou para outrem,
vantagem decorrente da adjudicação do objeto da licitação:
Pena – detenção, de 2 (dois) a 4
(quatro) anos, e multa.”
[10] Grife-se que o mesmo entendimento é
sustentado em seu Curso de Direito Administrativo (2011, p. 600)
[11] “§ 7 º Quando, por limitações do
mercado ou manifesto desinteresse dos convidados, for impossível a obtenção do
número mínimo de licitantes exigidos no § 3º deste artigo, essas circunstâncias
deverão ser devidamente justificadas no processo, sob pena de repetição do
convite.”
[12]
“[...] não existe na legislação nenhum impedimento para que o procedimento do
pregão seja considerado irregular, em que pese a participação de apenas um
licitante;
- se
apenas uma proposta é apresentada, esta é a única a avançar nos lances. Não se
pode olvidar a escorreita postura da pregoeira, que mesmo diante de apenas uma
proposta classificada realizou o convite previsto no art. 11, X, do Decreto
3.555/2.000 e conseguiu uma redução na proposta oferecida”. (TCU – Acórdão
64/2004 – Segunda Câmara – Relatório do Ministro Relator Ubiratan Aguiar).
[13] “Art. 49. A autoridade competente para
a aprovação do procedimento somente poderá revogar a licitação por razões de
interesse público decorrente de fato superveniente devidamente comprovado,
pertinente e suficiente para justificar tal conduta, devendo anulá-la por
ilegalidade, de ofício ou por provocação de terceiros, mediante parecer escrito
e devidamente fundamentado.”
[14] “Administrativo. Ação popular.
Licitação. Apenas um licitante interessado. Ausência de competição. Revogação.
Possibilidade não efetivada pela Administração. Ato discricionário. Observância
do interesse público. Mérito administrativo. Controle judicial.
Impossibilidade.
1) A ausência de competição, com a
existência de apenas um licitante interessado no objeto do certame, não impõe à
Administração Pública a revogação de todo o procedimento, sinalizando,
tão-somente, a existência da possibilidade de revogação, que poderá ou não ser
levada a efeito pelo Administrador, segundo seu próprio critério de
conveniência, mérito este que não se submete ao controle judicial, demonstrada
a correspondência com o interesse público, na hipótese concreta.
2) O IBAMA, intimado a externar as
razões que o levaram a optar pelo prosseguimento da licitação, afirmou que a
situação irregular da prestação de serviços de transporte no acesso ao Morro do
Corcovado era de tal forma grave que não seria possível esperar mais para
revertê-la. Assim, atenderia mais ao interesse público – e também ao interesse
da autarquia, que tem como uma de suas funções fiscalizar a preservação do meio
ambiente – prosseguir com a licitação, contratando empresa que assumisse, além
da prestação do serviço de transporte, o compromisso de respeitar as normas
ambientais”. (TRF2 APELREEX 200751010251137 RJ 2007.51.01.025113-7).
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